Em seu primeiro livro, a socióloga ludmila costhek abílio, professora da puc-campinas, investiga o trabalho de revendedoras de cosméticos da indústria de beleza brasileira
O ponto de partida desse estudo inovador é um exército de aproximadamente 1 milhao de revendedoras (equivalente à populaçao da cidade de campinas-sp), responsável pelo sucesso comercial de uma das mais importantes e reconhecidas empresas de cosméticos do país, a natura
Ancorada em um rico estudo de campo, a pesquisadora propoe uma abordagem original sobre o trabalho informal feminino dentro de um segmento denominado sistema de vendas diretas.além de analisar aspectos da produçao e distribuiçao da empresa e da economia informal, a autora traça o perfil socioeconômico das revendedoras, suas motivaçoes e como se dá o relacionamento com o trabalho e a empresa
Para isso, entrevistou desde faxineiras a mulheres de altos executivos, passando por professoras, donas de casa e até uma delegada da polícia federal, que vende os cosméticos no prédio da própria corporaçao.ao finalizar a pesquisa, ludmila constatou certa ambiguidade na relaçao dessas mulheres com a empresa, uma vez que começam a vender seus produtos com o intuito de consumi-los
Também percebeu que nessa dinâmica de trabalho o empregador transfere os riscos para as revendedoras, como a inadimplência de clientes, nao lhes dando garantia de rendimento, ao mesmo tempo que as encoraja a investir em estoques que podem nunca ser vendidos.'o livro também mostra como a feminilidade está implicada na construçao de novas formas de trabalho, que apelam para as identidades comuns de gênero e ao mesmo tempo diferenciam marcadamente as classes sociais', afirma a professora de economia ursula huws, da universidade de hertfordshire, no texto de orelha
Enquanto em uma ponta da escala vendedoras da classe trabalhadora garantem as vendas para consumidoras da mesma classe, na outra ponta estao as vendedoras da elite paulistana do 'setor crystal', um agrupamento exclusivo de pessoas pertencentes à classe alta ou que por ela circulam, mais interessadas na filosofia da empresa do que na renda em si
O relato de diva, 67 anos, casada com um empresário e moradora do bairro do itaim, confirma essa percepçao
Consultora do setor crystal há seis anos, relaciona as vendas de produtos natura com suas experiências de trabalho voluntário e voltado para a responsabilidade social.dentro do contexto que faz com que as revendedoras se tornem propaganda viva dos produtos, seu capital social pessoal se transforma em um meio para alavancar os lucros da companhia; um dos pontos centrais da discussao levantada pela socióloga diz respeito às indistinçoes entre tempo de trabalho e de nao trabalho, às formas atuais de envolvimento subjetivo do trabalhador
Esse embaralhamento das fronteiras entre produçao e consumo, inseparável das influências sociais e culturais, é um fenômeno novo, assim como a perda da centralidade do trabalho
O que a pesquisa mostra de maneira cristalina, diz leda paulani, professora da faculdade de economia e administraçao da universidade de sao paulo, 'é que o desaparecimento da exploraçao no ambito da teoria nao é senao o resultado da invisibilidade cada vez maior da exploraçao que caracteriza as formas atuais de articulaçao entre capital e trabalho
Essa é a verdadeira maquiagem do trabalho, tao criativamente denunciada no título deste livro'.segundo huws, a análise de costhek abílio contribui para os debates internacionais sobre o trabalho precário, para uma atualizaçao da ideia de informalidade e para o desenvolvimento de novas teorias sobre a economia informal e seu papel no desenvolvimento econômico
'até agora, o tipo de trabalho aqui estudado havia sido em grande parte ignorado por pesquisadores - embora possa muito bem se tornar familiar no futuro
Entretanto, a originalidade desta pesquisa reside nao só no tema, mas também na forma como amarra esses tópicos tao diversos, cada qual na vanguarda dos debates