Leitores de romances policiais nao precisam de disciplina intelectual
Costumam se entregar à leitura com uma displicência voraz
Se dificilmente largam um livro pela metade, nao é por questao de princípio nem por dever de ofício, mas apenas porque nao agüentam nao chegar ao fim: em geral, sao compulsivos
Possuem um tipo de imaginaçao que os faz iludir-se alegremente com as armadilhas do enredo
Fingem-se de inocentes, pois sabem que acreditar no que lêem é condiçao para desfrutar de um imenso prazer.a morte de rimbaud sugere que leandro konder é bem esse tipo de leitor
Talvez até se dedique à leitura comodamente escrachado no sofá da sala, numa dessas posturas que deixam apopléticos os ortopedistas.sem a sua experiência de leitor, ele com certeza nao teria escrito um livro que se enquadra com tanta exatidao no gênero policial
A trama envolve um milionário apaixonado por literatura francesa que resolve sustentar cinco escritores considerados por ele muito talentosos
O mecenas passa a chamá-los pelo nome de grandes autores franceses: rimbaud, aragon, rousseau, malraux e claudel
Oferece-lhes uma polpuda verba mensal e despacha-os anualmente para férias na frança
Rimbaud é encontrado morto
Pode ter sido acidente - ou nao
As características do gênero estao dadas
Existe, aqui, por exemplo, um provável assassinato; uma ilustre coleçao de suspeitos; um conjunto variado de motivaçoes para o crime e de oportunidades para cometê-lo; pequenas tramas paralelas que sao puro diversionismo; uma série de detalhes aparentemente gratuitos e que no entanto se revelam determinantes para o desenrolar da açao; um detetive paciente, pertinaz e autoconfiante, desses que sao capazes de se fazerem de bobos apenas para soltar a língua de um suspeito.isto é um romance policial, sem dúvida.mas também nao é.as epígrafes já desmentem o gênero
Nao costumam aparecer em policiais, muito menos capítulo por capítulo
E menos ainda se extraídas de autores como marx, maquiavel, petrônio, borges, drummond, shakespeare, fernando pessoa, rousseau, malraux, claudel, aragon e rimbaud
O filósofo leandro konder traz para este livro um pouco da erudiçao exigida pelo seu trabalho intelectual "verdadeiro"
Mas sabe muito bem combinar as coisas: dá à sua escrita a leveza de quem pode se fazer de inocente apenas para desfrutar de uma boa história.foi um leitor feliz que escreveu a morte de rimbaud.